Prazer de nascer uma mulher
Era noite… Por aí 22:00 horas. Estávamos no tempo colonial, era dia 20 de Dezembro de 1962. O Hospital Central de Maputo ainda se chamava Miguel Bombarda. Havia divisão de tratamento dos assimilados e não assimilados. Os assimilados eram os que tinham aceitado a cultura portuguesa, porque estava limpa, bem vestida e o meu marido falava português pensavam que fossemos assimilados e aceitaram que fosse atendida na enfermaria dos brancos e assimilados.
Naquela altura, entrávamos do lado da actual avenida Agostinho Neto, porque do outro lado da actual avenida Eduardo Mondlane era para os indígenas.
Ao chegar ao hospital, fui atendida e depois acamada na sétima enfermaria. Era uma sala espaçosa com várias camas, na parte traseira das camas havia berços. Deitada, eu rezava, rezava, rezava, mesmo sabendo que o sexo do bebé que estava na minha barriga não iria mudar, mas eu ficava ali a pedir silenciosamente a Deus para ser menina. Já tinha dado a luz a cinco meninos em quase 10 anos casada, eu queria uma menina.
Confesso que em todos meninos eu pensava que estava a carregar uma menina na barriga. Naquela noite um rio de sentimentos preencheu o meu coração. Vi a noite passar, não dava para acreditar, passei a noite inteira na expectativa e me perguntando é menina ou menino, e nada de resposta.
Amanheceu… Quando eram por aí 11 horas dei a luz. Depois, ainda acamada, ajeitei a minha cabeça olhando a enfermeira que estava do meu lado direito perguntei é menina ou menino? Ela respondeu que era menina. O meu coração quase que saía pela boca de tanta alegria. Devolvi a cabeça para almofada e a emoção tomou conta de mim. O meu sonho de trazer uma menina para o mundo acabava de acontecer. Acabava de sentir o prazer de dar a luz a uma menina.
A notícia circulou rapidamente entre os familiares: é menina, é menina, é menina. E muitos correram para o hospital para ver. Aquilo foi uma festa. As primeiras a chegarem foram a minha mãe e a minha sogra.
Na altura, o bebé ficava no berço 24 horas e só depois é que podia ser entregue à mãe para amamentar. A minha mãe quando chegou com a comadre olhou para ela e num tom de gozo perguntou em Xichangana (uma língua nacional): que vergonha é esta minha filha, esta menina é branca, traíste teu marido!? Eu respondi dizendo nada, também não sei como ela nasceu assim. Então a minha sogra aproximou do berço olhou bem e disse: nada, não é branca, é muito clara.
Depois de alguns momentos, chegou o meu marido na expectativa de ver a filha. Saudou e apressado aproximou-se do berço. A minha mãe e a minha sogra ficaram caladas na esperança de ver a reacção do meu marido. Ele pulou de alegria dizendo: é parecida com a minha avó. Ficava-se três dias no hospital, a alegria só aumentava. E no dia que voltei para casa, foi uma festa do hospital até chegar a casa: Esperança nasceu.
[Fim…]