Revista Biografia

Mingas

Nasceu, num domingo, a 13 de Setembro, na cidade de Lourenço Marques (actual Maputo), a quarta filha do casal Salatiel Jamisse e Alizarina Finiosse. Em homenagem a uma influente avó paterna, ganhou o nome de Elisa. E por ter nascido naquele dia especial da semana, ficou Domingas.

Elisa Domingas Salatiel Jamisse ou simplesmente Mingas teve uma educação religiosa, daí que a sua iniciação musical tenha decorrido na Igreja Metodista Unida, onde integrou os corais: infantil e juvenil.

Um dos exemplos disso foi a criação de um trio com Safrão Navesse e Silva Zunguze, também da mesma igreja, que interpretava canções religiosas. As actuações daquele trio eram exclusivamente para cerimónias da igreja. Ainda naquela fase de procura de inserção, Mingas foi activa nos grupos culturais da Escola Secundária Francisco Manyanga.

Aos 17 anos, acompanhou uma amiga aos escritórios dos produtores do espectáculo “Foguetão”, dirigido por Alex Barbosa, e ficou a saber que estavam à procura de uma voz. Na audição, interpretou a canção “I dont know how to love him”, da trilha sonora do filme “Jesus Christ Superstar”, tendo sido aceite. Os produtores propuseram que cantasse “I Need You”, dos O’jays, no Cine Estúdio 222.

Após aquela actuação, que marcou a sua estreia em grandes palcos, Mingas realizou o seu sonho de cantar “I dont know how to love him”, no Cinema Gil Vicente, num dos espectáculos “Xitimela 1001”, da Produções 1001. Foi um espectáculo importante para o início da sua carreira, tendo daí sido convidada a actuar regularmente no “Sheik”, uma popular discoteca de Maputo.

Embora também gostassem de música, os seus pais foram cautelosos quanto à carreira artística da sua filha. Não queriam que a música prejudicasse os seus estudos. Max, seu falecido irmão mais velho, foi quem apadrinhou as suas primeiras saídas para os espectáculos e isso ajudou a conquistar o apoio do resto da família. No início de carreira, Max transportava a Mingas para os locais de espectáculos e no regresso para casa. Aos organizadores de espectáculos, a família obrigou-lhes a providenciar transporte de casa para os locais de actuação e horários estritos de regresso.

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Depois do “Sheik”, Mingas passou a actuar no “Búzio” e “Zambi”, outras discotecas de referência na cidade de Maputo. As actuações resumiam-se em interpretações de canções de Miriam Makeba, Letta Mbulo, O’jays, Temptations, Roberta Flack, Donna Summer e Diana Ross. A intérprete era acompanhada por algumas das mais populares bandas do país: Hokolókwe, Africa Power e Conjunto João Domingos.

Com o país em guerra, calamidades naturais e carência de quase tudo, o início dos anos 80 foi bastante complicado para os músicos. A indústria de entretenimento foi também abalada, tendo sido marco disso, o encerramento de discotecas e a redução drástica de oportunidades de espectáculos nas poucas ainda operacionais. Na sequência disso, alguns artistas deixaram o país para destinos como África do Sul, Swazilândia e Portugal.

Apesar do cenário, Mingas embarcou numa digressão pelo país, com o Grupo Hokolokwé, entre 1982 e 1983. Na excursão, sob os condicionalismos da guerra, Mingas escalou todas as províncias do país, excepto Niassa.

Finda a digressão, Mingas decidiu tentar a sorte na África do Sul. Entre 1984 e 1985 fixou-se em Nelspruit (actual Mbombela), onde trabalhou com alguns músicos, mas não foi além dos ensaios.

Orquestra Marrabenta e Grupo RM

De regresso ao país, em 1987, foi convidada a trabalhar com a Orquestra Marrabenta Star de Moçambique, com a qual viria a destacar-se na interpretação de canções populares como “Elisa Gomara Saia” e “A Va Sati va Lomu”. Rapidamente as suas versões daquelas canções conquistaram a atenção dos ouvintes da Rádio Moçambique, na altura única rádio no país.

Além de Wazimbo e Mingas, destacava-se na Orquestra Marrabenta Star a cantora Dulce, que durante muitos anos viveu no Zimbabwe. Formada com base em elementos do Grupo RM, a Orquestra Marrabenta Star tinha como propósito tornar a música moçambicana mais conhecida e apreciada no estrangeiro.

Foi com o grupo que, em 1987, ela fez as primeiras digressões internacionais, com realce para repetidas actuações em espectáculos do movimento “Beat Apartheid” nos países nórdicos – Dinamarca, Holanda, Noruega e Suécia. Escalaram igualmente a Alemanha, França, Inglaterra, Portugal, Cabo Verde e Zimbabwe.

No Zimbabwe, Mingas, que além de cantar era dançarina da Orquestra Marrabenta, teve a oportunidade de partilhar o palco com Miriam Makeba, Paul Simon, Harry Belafonte, Manu Dibango, Hugh Masekela, entre outros. Em 1988, no Concerto “Child Survival and Development Symposium”, organizado pela organização internacional “Save the Children”. Foi também, em Zimbabwe, que o grupo gravou os discos “Independance” e “Piquenique”, ambos publicados pela editora alemã “Piranha”, em 1989 e 1996, respectivamente.

Mas a relação com o grupo não durou muito. Em 1989, Mingas passou a integrar o Grupo RM, do qual mais tarde se tornou líder. O passo foi um marco indelével na sua vida musical, passando a ganhar mais notoriedade e espaço. Um dos sinais disso foi o convite que de imediato recebeu para participar, na capital do Brasil, Brasília, com Gilberto Gil e Hermeto Paschoal, num espectáculo integrado no encontro de jornalistas da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, em Outubro de 1989. De Angola participou o grupo “Ilundu”, e Cabo Verde fez-se representar por Zeca Di Nha Reinalda.

No mesmo ano, Mingas gravou “Aliranzo”, composta por Chico António, e a sua composição original “Nweti”. Refira-se que o tema foi considerado “Melhor Canção no Ngoma Moçambique – 89”, um dos principais prémios de música moçambicana. Ainda no “Ngoma”, Mingas viria a ser novamente galardoada como o título “Melhor cantora”, em 1993, com a canção “Nwananga”; e “Canção do ano”, com “Hloniphu”, em 2006.

Depois do sucesso inicial com a canção “Nweti”, Mingas começou a colocar mais ênfase na criação de suas próprias composições, maioritariamente interpretadas em Xitswa, uma língua Bantu falada no sul de Moçambique. Além de Xitswa de Inhambane, de onde são naturais os seus pais, ela canta em Cicopi, Xironga, Português e Inglês. As suas canções versam injustiças sociais, amor e paz.

Com garantido sucesso no mercado interno, Mingas procurou conquistar outras praças. O ponto de entrada foi dado pelo registo da canção “Baila Maria”, um dueto com Chico António, que, em 1990, conquistou o “Grand Prix Decouvertes 90” (Grande Prémio do Concurso Descobertas), organizado pela Rádio France Internationale (RFI). O prémio foi entregue, no mesmo ano, na Guiné Conakry.

De seguida, Mingas actuou com o Grupo Amoya (nome dado ao Grupo RM por conveniência) no clube de jazz “New Morning”, em Paris. Em 1992, participou na gravação do CD “Cineta” no estúdio Marcadet. O disco foi editado em Novembro do mesmo ano pela RFI/Forlane.

Filmes e Solidariedade

O seu talento despertou também a atenção dos realizadores de cinema. Sol Carvalho, referência do cinema moçambicano, convidou-lhe a interpretar canções da banda sonora do documentário “A Guerra de todos nós”. A colaboração entre Sol e Albie Sachs teve posteriormente uma versão em Inglês, “The Deeper Image”. Outra colaboração em filmes aconteceu em 2006 na trilha de “O Jardim do Outro Homem”, também de Sol de Carvalho.

Outra vertente que despontou, na altura, foi a sua participação em iniciativas humanitárias. Em 1994 produziu um espectáculo para angariação de fundos a favor das vítimas do ciclone Nádia, que atingiu o norte de Moçambique. Em 2007, realizou outro espectáculo humanitário, dessa vez dedicado às vítimas das explosões do Paiol de Malhazine, em Maputo.

Além de participar em “spots” da UNICEF sobre os Direitos da Criança e outros de educação eleitoral, Mingas contribuiu, em 2002, com a canção “Xini Xiku Hluphaku”, no disco “Vidas Positivas”, da organização Médicos Sem Fronteiras. Trata-se de um disco de canções sobre a prevenção de HIV e SIDA.

Colaboração com Miriam Makeba

Em Dezembro de 1994, Miriam Makeba, após ouvir canções de Mingas em Maputo, convidou-a para a sua casa, em Joanesburgo, para se preparar para fazer os coros numa digressão pela Europa e Austrália. Admiradora de Miriam Makeba desde a infância, Mingas não teria outra prenda para terminar o ano.

Entre 1995 e 1998, Mingas acompanhou Makeba em digressões pela Europa (Alemanha, Áustria, Dinamarca, Itália, França, Suécia e Noruega), América do Sul e do Norte (Estados Unidos, Canadá, Brasil), África (Costa do Marfim, Namíbia, Swazilândia, Tunísia) Austrália (Sidney, Brisbane, Melbourne e Perth). Em cada espectáculo, Makeba dava a oportunidade de Mingas interpretar as suas próprias canções.

Nas digressões, Mingas pisou palcos como a famosa “Sydney Opera House”, em 1995, e participou em sessões memoráveis como o concerto de Makeba para o Papa João Paulo II, em 1997. O trabalho com Miriam Makeba foi uma das melhores experiências de sempre da carreira musical de Mingas.

Saudades

De regresso à Moçambique, em 2001, Mingas foi recebida com muita expectativa pelos seus fãs. Para responder a isso, organizou, no Cine-Teatro África, em Maputo, o espectáculo “Saudades”, que relançou a carreira a solo e reafirmou o seu lugar no cenário musical nacional. No espectáculo, Mingas despejou, no bom sentido, a experiência acumulada no trabalho com a Mama África, como Makeba era tratada em todo o mundo.

A seguir ao memorável espectáculo, Mingas passou a ser solicitada para espectáculos de grandes corporações, instituições e comunidade diplomática. Marcou também presença consideravelmente regular em eventos realizados na África do Sul e colaborou em iniciativas humanitárias.

Realce pode ser dado ao espectáculo de abertura da Cimeira da União Africana, com Miriam Makeba, em 2003; abertura do espectáculo “aquele abraço”, do brasileiro Gilberto Gil, em 2004; actuação, em 2004, na gala alusiva à Independência Nacional, no Palácio da Ponta Vermelha; actuação na festa de despedida do Presidente Joaquim Chissano, em 2004, organizada pelo Alto Comissariado da África do Sul e comunidade empresarial daquele país, todos em Maputo.

Na África do Sul, Mingas participou na espectáculo “Miriam Makeba pays tribute to Dolly Rathebe”, homenagem de Makeba a “Dolly”, ícone da música local, sob direcção de Hugh Masekela; animou a inauguração do “The Nelson Mandela Centre of Reconciliation”, na presença do casal Nelson Mandela e Graça Machel; em 2004, actuou no “Athlone Stadium”, na Cidade do Cabo, na celebração do 10.º Aniversário da Liberdade, ao lado de Judith Sephuma, Simphiwe Dana, Sipho Mabuse, Jimmy Dludlu e Oliver Mutukudzi.

Graças à sua popularidade, Mingas foi convidada, em 2005, para integrar o primeiro “júri” do concurso musical “Fama Show”, da STV.

…depois de saudades, solidariedade, o DVD

Resolvidas as saudades e retomada com sucesso à carreira a solo, havia ainda uma questão por resolver: “quando é que sai o disco?” A resposta a isso saiu em 2005, com o lançamento do compacto disco “Vuka Africa”, que em pouco tempo esgotou. A reedição seria apenas em 2009, mas apesar de quatro anos de separação da primeira a procura foi alta.

Mesmo empenhada na promoção do seu próprio disco, Mingas continuou a ser solicitada para grandes eventos em Maputo. Foi assim que em 2007 e 2008, respectivamente, Mingas abriu os espectáculos de Mariza, principal voz do fado Português; e da brasileira ‘Mart’Nália.

Em Junho, Mingas participou na Semana de Moçambique, no Casino Estoril e no Parque Monsato, em Portugal. Em Agosto retornou à África do Sul para cantar no “Newtown Women In Arts Festival”, no Bassline, em Joanesburgo, partilhando o palco com Tandiswa Mazwai e Lira.

No mesmo ano, Mingas animou o jantar de gala oferecido ao Presidente da China, Hu Jintao, de visita à Moçambique, no Palácio da Ponta Vermelha.

No final do ano – 23 de Novembro – Mingas celebrou trinta anos de carreira com um espectáculo, com lotação esgotada, no Centro Cultural Franco Moçambicano, em Maputo. O evento, com direcção musical de Jimmy Dludlu e produzido pela Sonarte, foi gravado e publicado em DVD, em Novembro de 2009.

Em retribuição ao povo, sua fonte de inspiração, realizou, em 2008, o show ‘Mingas em Concerto’ grátis, na Escola Secundária Quisse Mavota, no bairro Zimpeto, em Maputo, onde foi tratada com carinho.

Depois de a sua canção “Nweti” ter sido incluída na compilação “Women of the world”, da editora Putumayo, em 2008, Mingas voltou a colaborar noutro disco: “Phola”, de Hugh Masekela, com a canção “Malunguelo”.

2009, digressões e mais

Um dos marcos de Mingas em 2009 foi a assinatura de um contrato de patrocínio com a companhia de telefonia móvel MCEL, cujos benefícios incluíram uma digressão pelo país. No quadro da colaboração, participou no II Festival de Jazz de Moçambique, em Abril, na cidade de Maputo.

Ainda na capital moçambicana, apresentou-se, em Fevereiro, com Yvonne Chaka Chaka na celebração do Dia da Mulher Sul-Africana, evento realizado pelo Alto Comissariado da África do Sul; actuou, em Julho, no Centro Cultural Franco Moçambicano, para fechar a primeira etapa da digressão nacional; e, em Novembro, participou no lançamento de um disco de Lizha James.

Fora de Moçambique, em 2009, Mingas voltou a pisar o Zimbabwe para um espectáculo com a jovem cantora Dudu Manhenga. Com Dudu, Mingas voltaria a partilhar o palco em Joanesburgo e Maputo. Na Europa, escalou as cidades de Berlim e Munique, na Alemanha; e Praga, na República Checa.

Na vertente social, gravou um “spot” sobre os direitos da criança para o UNICEF e participou na gravação de uma canção sobre a educação eleitoral, de parceria com Stewart.

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