Revista Biografia

Natividade Bule

Antigamente, Gaza era uma província repleta de tradições pré estabelecidas pela sociedade. Não que tenha deixado de ter, mas na altura era muito mais intenso que actualmente.

A poligamia era tratada naturalmente. Haviam situações em que a primeira e as outras esposas habitavam na mesma casa. E o cumprimento do ritual tradicional para unir-se amorosamente com o parceiro era de cumprimento obrigatório.

Foi naquele contexto, que o distrito de Chidenguele, na província de Gaza, acolheu, a 27 de Fevereiro de 1953, o nascimento de Natividade da Glória Bule.

Ela é a primeira filha da enfermeira Palmira Filipe Bule, que era a segunda mulher do seu pai Pedro Amós Chemane. Pelo facto de o seu pai não ter pago o “lobolo” (casamento tradicional) foi lhe recusado a possibilidade de ele ter o seu apelido nos nomes dos filhos que teve com Palmira.

Assim, Natividade, Ana Maria e Pedro tiveram o apelido da mãe e cresceram ao lado da enfermeira, que fazia os seus trabalho de casa em casa. Refira-se que ser professor e enfermeiro eram as profissões de prestígio, na altura.

Enquanto a mãe procurava rendimentos, para casa, Natividade e seus irmãos procuravam ajudar, fazendo actividades domésticas como precorrer distância na procura de lenha e cartar água. Nas férias escolares, procuravam mafura e castanha para vender na loja da zona.

Em Chidenguele, Natividade estudou até a quarta classe. Atenção que na era colonial ter quarta classe era prestigiante. Mas para alcançar essa categoria, passou por dificuldades.

Ela tinha de precorrer cerca de três quilometros a pé, para chegar a escola, ou seja, precorria cerca de seis quilómetros a pé por dia, durante os cinco dias úteis da semana.

Quando atrasava, era severamente punida. Quem chegava tarde à escola, na altura, tinha de levar a mão direita para a orelha esquerda, e a mão esquerda para a orelha direita, e puxar os dois membros localizados nas laterais da cabeça, enquanto agachava lentamente várias vezes.

Após concluir a quarta classe foi para Xai-Xai, onde juntamente com os irmãos fora viver com a tia Berca. Lá prosseguiu com os estudos, fazendo o ensíno técnico na Escola Braga Paixão.

Apesar de a mãe ser enfermeira e ter uma machamba, os rendimentos não eram suficientes. Para reverter o cenário, ela decidiu passar a mandar produtos como peixe, carvão, e tangerinas para os filhos venderem no bazar.

Aos 18 anos de idade, Natividade mudou-se para a então cidade de Lourenço Marques, após a mãe ser transferida para a capital colonial.

Em Lourenço Marques, encontrou uma vida diferente. Aí notou que não sabia atravessar a estrada e tinha dificuldades em expressar-se.

Depois de morar por pouco tempo em Ka-Tembe, passou a viver com o tio Valente Estevão Tutu e prossegui com os estudos na Escola Comercial de Maputo. Através do seu primo Domingos Tutu, conheceu Narciso Mates, com quem relacionou-se.

Em 1975, casou-se com Mates, com quem teve dois filhos, mas mais tarde divorciou-se. E de lá a esta parte continua solteira.

Passagem pelo aparelho do Estado

Após a proclamação da Independência Nacional, em 1975, Natividade Bule fez parte do grupo que foi levado na Escola Comercial para abrir o Ministério da Administração Interna.

Anos depois, foi trabalhar no Ministério dos Negócio Estrangeiros. Naquela época, teve a oportunidade de ir ao estrangeiro. Natividade fora trabalhar no sector financeiro da Embaixada de Moçambique no Malawi.

Naquele país, viu algo diferente. É que as mulheres faziam actividades de venda. Elas viajavam à África do Sul e iam comprar produtos para revender para os malawianos. Assim, ela criou um pequeno negócio. Montou uma capoeira e começou a vender ovos.

Depois de algum tempo, decidiu abandonar o aparelho do Estado e voltar à Moçambique e reniciar a vida.

As primeiras semanas foram complicadas. Na altura, era proíbido arrendar a casa. Mas ela arrendou a casa grande e foi morar com a filha na dependência, onde dormiam numa biliche.

Ao arrendar a casa, Natividade queria apenas estar segura de que nesse reinício da sua vida, conseguiria pagar a escola da filha. Com o seu filho, não teve muito por se preocupar. Ele estava a viver com os tios nos Estados Unidos da América.

A empreendedora apostou no negócio de venda de ressóis com a sua amiga Atalia Macome. Natividade era motorista. Os ressóis eram feitos em sua casa. O carro era do marido da sua amiga. O produto era vendido nos dias úteis da semana e no fim-de-semana pagavam a empregada, a corrente eléctrica e outras despesas.

Natividade no mundo empresarial

Moçambique estava numa fase de transição do socialismo para o capitalismo. E acabara de introduzir o Plano de Reabilitação Económica (PRE).

Surgiu então a senhora Felicity Hermanson, investidora de nacionalidade zimbabweana, que tinha uma empresa de aviação na Suazilândia e queria abrir uma do género em Moçambique. Um amigo indicou Natividade como a pessoa que podia ajuda-la a montar a empresa, uma vez que a investidora conhecia muito pouco o país.

Natividade conheceu a senhora e juntas criaram uma sociedade para abertura da empresa de sharp. O empreendimento dedicava-se à área de transportes aéreos e chamava-se Scan Transportes Aéreos. Foi com Felicity Hermanson, que aprendeu a fazer gestão de empresas.

Na altura, Moçambique estava atravessar por uma guerra civil, que durou 16 anos (1976-1992), por força disso muita gente viajava de avião.

Entretanto, pouco tempo depois a empresa fechou, devido a danos humanos e materiais causados pela guerra. Natividade voltou a estaca zero. E mais tarde abriu uma tabacaria denominada “Tia Joaninha”, que existe até hoje, mas tem o nome de “Tia Catarina”, pois passou para outra pessoa.

Depois da assinatura dos Acordos de Paz, na cidade de Roma, em 1992, houve uma transformação em Moçambique. E Natividade voltou a apostar forte no empreendedorismo.

Em 1992, fundou a sua principal empresa, a Catucha Trading, na qual é sócia com os seus dois filhos. A empresa é vocacionada na organização de todo tipo de eventos.

Actualmente, Natividade Bule é uma das empresárias de sucesso no país e além fronteiras. Voltou recentemente para a carteira. Academicamente, é Licenciada em Ciências Jurídicas, e pós-graduada em Direito de Empresa. Possui especializações nas áreas financeiras, gestão e organização empresarial.

Consta também na sua carreira profissional, passagem por diversos cargos de responsabilidade e foi professora. Actualmente dirige a “Mulher Caixa de Poupança e de Crédito”, um micro-banco criado por um grupo de 15 mulheres nacionais, na qual Natividade é integrante. A sua filha é uma executiva casada e está a trabalhar numa grande empresa angolana. E o filho que cresceu nos EUA, está a trabalhar em Maputo.

Bibliografia

“O Papel da Mulher no Desenvolvimento”. Savana [cidade de Maputo] 8 de Março de 2013: pag. 6. Impresso.

CONCEIÇÃO, Amélia. “...quando estava no Xai-Xai vendia no bazar...”. Acessado a: 11/04/2016.

NHACUAHE, Arcénia. “INAUGURADO BANCO VOCACIONADO A MULHER”Acessado a: 11/04/2016.

PANGUANE, Sílvia. “Natividade Bule, uma mulher de armas”Acessado a: 11/04/2016.

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Catucha Trading. Home. Acessado a: 11/04/2016.

MIRAMAR. “MESA PRA 2 NATIVIDADE BULE BLOCO 01”. Acessado a: 11/04/2016.

MIRAMAR. “MESA PRA 2 NATIVIDADE BULE BLOCO 02”. Acessado a: 11/04/2016.

MIRAMAR. “MESA PRA 2 NATIVIDADE BULE BLOCO 03”. Acessado a: 11/04/2016.

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É jornalista e webdesigner desde Setembro de 2013. Na sua caminhada jornalística, está registada sua passagem pelo jornal O Nacional; Revista ÍDOLO, onde chegou a desempenhar as funções de editor executivo; para além de ter sido oficial de marketing digital na Ariella Boats. Foi, também, jornalista correspondente da Revista MACAU, em Moçambique. Actualmente é jornalista do jornal Notícias. É, desde 2020, licenciado em jornalismo, pela Universidade Eduardo Mondlane (UEM). Sua caminhada no mundo do empreendedorismo digital iniciou com o lançamento da plataforma Biografia, em 2016. É também, o fundador do site evangelístico Chave de Davi, em 2018; e da loja online O Ardina Digital. Todos projectos foram concebidos ao lado do seu amigo Deanof Potompuanha.

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