Josina Machel
Josina Machel (1945-1971) é uma heroína moçambicana. É considerada ícone da emancipação da mulher em Moçambique. Aliás, a 7 de Abril de 2011, dia em que se deu a passagem do 40.º aniversário após a sua morte, população, políticos e colegas de batalha na Luta de Libertação Nacional, juntaram-se em Chilembene, província de Gaza, onde tentaram definir a sua figura.
Naquele evento, Zina, como era carinhosamente chamada, foi caracterizada como exemplo de coragem excepcional e transcendental, incomum entre os mortais.
Josina Abiatar Muthemba nasceu na província de Inhambane, sul de Moçambique, na madrugada do dia 10 de Agosto.
O seu nome é fruto da grande amizade entre o seu pai, o enfermeiro Abiatar Muthemba, e a Dr.ª Josina de Lima Ribeiro, médica no então Hospital Miguel Bombarda, actual Hospital Central de Maputo.
Zina iniciou os seus estudos na Escola Dom João de Castro, em Mocímboa da Praia, no norte de Cabo Delgado, distrito para onde o seu pai havia sido transferido.
Em casa, a sua mãe, Alfina Muthemba, procurava estimular os seus filhos a estudar. Ela punha-os a competir para ver quem era o mais rápido nos cálculos matemáticos e no ditado de português. O vencedor recebia uma dose de “lifetse”, um doce muito apreciado no sul de Moçambique.
Mais tarde, Abiatar Muthemba voltou a ser transferido, desta feita, para a província de Gaza. E Zina teve de completar o ensino básico na Escola Mouzinho de Albuquerque, em Xai-Xai.
Aos 13 anos de idade, nasceu, na menina que gostava de fazer duas tranças com um risco no meio, o sonho de querer torna-se contabilista e mudou-se para a capital colonial, a cidade de Lourenço Marques (hoje cidade de Maputo).
Em Lourenço Marques, pretendia receber aulas de compensação, vulgo explicação, para o exame de admissão na Escola Comercial (hoje Instituto Comercial de Maputo), situada junto ao Liceu Salazar (actual Escola Secundária Josina Machel).
O exame de admissão foi feito com sucesso, tendo depois terminado o quinto ano com a mesma alegria. Na capital, Zina morava em casa da sua avó materna, Ana Macome, no bairro Chamanculo, um viveiro do nacionalismo. Foi lá, onde nasceu, na Josina, o interesse pela causa da independência. Tudo deu-se quando vários elementos da sua família foram presos.
Foi neste contexto, que em Março de 1964, Josina Muthemba, Armando Guebuza (na altura, Presidente do Núcleo dos Estudantes de Moçambique), Ângelo Azarias Chichava, Milagre de Jesus Mazuze, Adelina Paindane, Cristina Tembe, e Mariana Saraiva Mpfumo, decidiram deixar Moçambique para se juntarem à Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
Para escapar ao controlo da PIDE, a terrível polícia secreta do regime colonial, tiveram de abandonar, em Mapai, a cerca das 4:00 horas da manhã, o comboio em que se faziam transportar para sair de Moçambique.
Fizeram depois, mais de 80 quilómetros, de Mapai à Vila Fronteiriça de Chicualacuala a pé, desafiando o cansaço, a fome e a sede.
Vinte e quatro horas depois de terem deixado o comboio, e encontrando-se do lado rodesiano, continuaram a caminhar ininterruptamente mais de 30 km até retomarem o comboio para Salisbúria (hoje Harare). Naquele percurso, juntaram-se a eles mais dois moçambicanos, Simione Chivite e Amos Mahanjane, seguindo a mesma viagem.
De Salisbúria, o grupo que integrava Josina Muthemba, retoma a viagem para a Zâmbia. No comboio, foram presos pela polícia rodesiana, quando se preparavam para abandonar aquele país, e encarcerados em Victória Falls.
Zina e os seus colegas foram, depois, deportados e entregues à PIDE. Durante aproximadamente cinco meses, foram sistematicamente torturados.
Já na cruel Vila Algarve, a sede da PIDE, Josina foi várias vezes interrogada. Na ocasião, foi-lhe oferecida uma bolsa para ir estudar em Portugal. No entanto, a oferta foi recusada.
Josina e seus colegas foram depois libertados e permaneceram numa liberdade vigiada. Não obstante a intimidação da PIDE, o sonho de juntar-se à FRELIMO foi retomado.
Em Abril de 1965, voltaram a insistir uma outra fuga, desta vez indo da Suazilândia, onde permaneceram por alguns meses. Mais tarde conseguiram atravessar clandestinamente a África do Sul e, no protectorado britânico da Bechuanalândia, hoje Botswana, foram novamente detidos e ameaçados com a deportação pelas autoridades britânicas.
Em resultado da intervenção de Eduardo Mondlane, presidente da FRELIMO, exigindo a sua incondicional libertação, o grupo foi entregue ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados e conduzido para a Zâmbia. Mais tarde foi encaminhado para a Tanzânia, levado por Mariano Matsinha, então representante da FRELIMO, na Zâmbia.
O grupo chegou na Tanzânia, em Agosto de 1965. Josina começou a trabalhar na administração do Instituto Moçambicano, sendo o braço direito de Janet, a esposa de Eduardo Mondlane.
As qualidades da jovem impressionaram Mondlane. Em pouco tempo de integração, Zina recebeu do presidente a importante missão de organizar a educação política de uma unidade de mulheres na província do Niassa, onde a Luta de Libertação Nacional se desenvolvia com particular intensidade.
No II Congresso da FRELIMO, que teve lugar em 1968, Josina foi eleita delegada, através do cargo defendeu a inclusão plena das mulheres em todos os aspectos da luta de libertação. Mais tarde, assumiu a chefia da Secção da Mulher, no Departamento de Relações Exteriores.
A intenção de abraçar a vida dura e violenta foi manifestada quando Eduardo Mondlane mandou Mariana Pachinuapa para orientar uma palestra na Escola da FRELIMO, na Tanzânia, onde encontrou Josina Muthemba que lhe disse: “Quero ir para Nachingweya treinar.” E teve como resposta: “Não! Fica a estudar”.
Zina saiu dali triste, mas não desistiu. Prova disso é a carta enviada pedindo para deixar de estudar para ir treinar, em Nachingweya. Na carta tinha uma foto meio corpo, onde constavam as palavras: “Com votos de sucesso na revolução.”
Em 1968, Mondlane deu à Josina, uma bolsa para ir estudar na Suíça. Zina recusou e reafirmou que queria ir treinar em Nachingweya. E o seu pedido acabou por ser aceite.
A jovem foi recebida, em Nachingweya, por Marina Pachinuapa, que lhe levou para o treino. A preparação começava às 8:00 horas e terminava as 19:00 horas, sem beber água e sem comer. No fim do treino, Marina perguntou-lhe: “Quer esta realidade?” E Josina respondeu: “É isso mesmo.”
Este episódio despertou o interesse e a atenção de Samora Machel (um dos líderes da FRELIMO, que depois viria a ser o fundador do Estado moçambicano). Em finais de 1968, Samora e Josina começaram a namorar.
Mondlane, ao receber a notícia, aconselhou Samora a casar rapidamente. Samora Machel e Josina Muthemba casaram-se a 4 de Maio de 1969, no centro Educacional do Tunduro, no sul da Tanzânia, e Zina adoptou o nome Josina Machel.
A 23 de Novembro de 1969, nasceu Samora Machel Júnior, conhecido como Samito, primeiro e único filho da guerrilheira.
Josina voltou a trabalhar como chefe de Assuntos Sociais, com especial responsabilidade para o bem-estar dos órfãos da guerra, e para a saúde e educação de todas crianças em zonas de conflito do norte de Moçambique, mas a sua doença agravou-se.
Em 1970, viajou para a União Soviética, onde procurou um diagnóstico para a sua debilidade crónica, mas sem sucesso.
O facto não afastou Josina do trabalho. As digressões às zonas libertadas do Niassa e Cabo Delgado foram intensificadas, porém o grave problema do fígado minava o seu corpo. Aos 26 anos de idade, continuava frágil.
A 6 de Março de 1971, Josina fez a sua última viagem para Cabo Delgado, onde ia inteirar-se da situação vivida pelas crianças dos infantários da FRELIMO, naquela província.
Entretanto, Josina ardia de febre e enfrentou dificuldades para fazer a sua intervenção junto da população. Já na fronteira, de regresso à Dar-es-Salam, Zina tirou a pistola e disse: “Entreguem-na ao camarada dirigente da província para que sirva de salvação do povo moçambicano.” E acrescentou: “Camaradas eu já não avanço mais, mas estou preocupada com a revolução e as crianças.”
No dia 6 de Abril, o seu estado de saúde agravou-se. Na noite daquele dia foi, a contragosto, levada por Joaquim e Marcelina Chissano para o Hospital de Muthimbili, em Dar-es-Salam, onde acabaria por perder a vida, na madrugada do dia 7 de Abril, deixando um filho com apenas 16 meses.
A causa independentista viria a ser conquistada quatro anos depois da sua morte. O dia 7 de Abril é feriado em Moçambique e é considerado Dia da Mulher Moçambicana, em homenagem aos feitos de Josina. Em Maputo, o anterior Liceu Salazar ficou com o seu nome, bem como um hospital em Luanda, capital angolana.
Bibliografia
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Página oficial de Armando Emílio Guebuza. Biografia do Presidente Armando Emílio Guebuza. Disponível em: <http://www.armandoemilioguebuza.mz/wp-content/uploads/2015/08/Biografia_do_Presidente_Armando_Emi%CC%81lio_Guebuza.pdf> Acesso em 25/3/2016.