Curta nota biográfica de Paulina Chiziane
Ao ver um pedaço de papel e um lápis, Paulina Chiziane já começava a rabiscar, criando histórias. Era algo natural na sua infância. Daí que não sabe dizer quando iniciou a escrever, mas começou a dar conta da sua queda para escrita quando, ainda na escola primária, elaborou uma redacção sobre a Páscoa e recebeu rasgados elogios da sua professora. Ali começou a tomar a escrita mais a “sério”.
Paulina Chiziane nasceu numa família cristã (protestante), a 4 de Junho de 1955, em Manjacaze, província de Gaza. Contudo, tem uma visão diferente da que é oferecida pela religião, ou seja, não concorda que a mulher seja vista como coadjuvante. Para Chiziane a mulher tem voz e papel de protagonista.
A sua obra nasce para materialização da visão da mulher como protagonista. Foi com o intuito de mostrar que as mulheres também se levantam e têm muitas capacidades que Paulina se levantou com ousadia, através da escrita. A autora propõe determinados temas e pontos de vista ignorados em debate. Foi um “meio choque” para sociedade que lê, pois esperava-se de mulheres na altura que escrevessem sobre coisas bonitas, cor-de-rosa, idealizações, falando de amor, falando de criança.
Outro dado a ter em conta é que durante a juventude foi militante da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), principal movimento de luta pela independência do país do domínio colonial de Portugal. A combinação dos dois contextos, referenciados, na sua vida enquanto mulher, levaram com que a sua obra procurasse “descolonizar a mente do moçambicano” e evidenciar o papel da mulher na sociedade, através da reconstrução do contexto social moçambicano por meio da literatura.
Começou a publicar por volta de 1984 e, em 1990, lançou o seu primeiro livro: Balada de amor ao vento. Paulina Chiziane tornou-se, assim, na primeira mulher a publicar um romance, um título que ela nega. Pois, afirma que o que escreve não são romances, mas sim histórias grandes.
A contadora de histórias grandes é autora dos livros: Ventos do Apocalipse; O Sétimo Juramento; Niketche; As Andorinhas; O Alegre Canto da Perdiz; Na mão de Deus; Por Quem Vibram os Tambores do Além?; e Ngoma Yethu. Paulina escreve sobre o silêncio e tabus, utilizando para tal a coragem, trabalho, e pesquisa. Ela escreve as suas histórias inspirando-se nos contos à volta da fogueira.
As suas personagens são pessoas que lhe rodeiam, que são mulheres. Às vezes, por exemplo, pega no seu gravador, senta na rua e conversa com a primeira mulher que passa e tem uma história, outras vezes vive.
“Na mão de Deus” é exemplo de um livro que ela viveu. Em 2012, Paulina quis entregar um trabalho concluído a qualquer custo e a cabeça não suportou. Teve uma crise psicótica, tendo ido parar no hospital psiquiátrico. Foi lá onde descobriu que existe um mundo ainda por ser descoberto e escreveu o livro. “Ngoma Yethu” é exemplo de um livro que nasceu de uma conversa, onde a escritora pôs uma curandeira a analisar o novo testamento da bíblia e escreveu o livro, causando mais uma polémica.
Por escrever diferente, ela acabou intitulando-se uma guerreira, pois depois de cada obra provoca polémica e tem de enfrentar os sectores sociais conservadores em Moçambique. Paulina Chiziane já foi chamada de feminista, espiritista, e curandeirista, por causa das suas obras, adjectivos recusados, já que ela não procura agradar a ninguém quando escreve, simplesmente pretende usar o poder da literatura para mostrar para sociedade o lado positivo e negativo das coisas.
Paulina considera-se filha de gente de grande pensamento, com herança cultural, religiosa, e histórica; disposta a lutar para recuperar o que foi perdido com a colonização. Paulina Chiziane olha a sua luta como uma pedra que é lançada hoje para que no futuro o Moçambique que sonha possa ser construído.
A autora venceu, em 2003, o Prémio José Craveirinha, a comenda literária mais importante do país, com seu livro Niketche – Uma História de Poligamia, foi condecorada, em 2013, pelo Governo português com o grau de Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, e venceu o Prémio Camões 2021. Paulina Chiziane é estudada por escritores moçambicanos e brasileiros. As suas histórias são adaptadas para bailados e peças teatrais.
Bibliografia
Entrevista com a escritora moçambicana Paulina Chiziane – O Povo, 17/04/2017
Paulina Chiziane: “Não volto a escrever. Basta!” – O País, 10/07/2016
A escrita sagrada da romancista moçambicana Paulina Chiziane – Brasil de Fato, 21 de Setembro de 2016
Os anjos de Deus são brancos até hoje, entrevista a Paulina Chiziane – Baula, 26/11/2014