Revista Biografia

Neyma Alfredo

Ainda era muito nova quando Lina Duarte perdeu a vida. Órfã de mãe, Neima Júlia Alfredo fora viver com o seu pai, Paulino Alfredo, que lhe batia muito. E a miúda acabou por ir morar com a tia. Paulatinamente ajudou-lhe a encarar a vida positivamente.

As palavras têm significado, pelo contrário, não faria sentido existirem, não é verdade?! Bom, adolescência significa “fase para crescer”. É naquela etapa da vida que o ser humano começa a dar uma certa perspectiva do que pretende que a sua vida seja no futuro. Com Neima não foi diferente.

Ela tinha uma série de desejos para o futuro. O principal era ser dançarina. Neima gostava de dançar. Dançava quase tudo que se tocava na rádio. Contudo, a dança não era um sonho acabado, pois estava sujeito a mudanças. E de facto mudou. Em 1995, quando tinha 16 anos de idade, participou no concurso musical de procura de talentos, “Fantasia”, onde descobriu a sua paixão pela música.

Apesar de viver com a tia, por vezes deslocava-se para casa do pai. A sua participação no “Fantasia” não foi apoiada por Paulino Alfredo. Além de batê-la, fê-la faltar à algumas galas. Todavia, Neima continuou a participar do programa, ainda que sofresse pancadaria.

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Fã incondicional de Michael Jackson, Neima viu-se frustrada quando a produção do “Fantasia” recusou que interpretasse uma das músicas do “Rei do Pop”. A jovem acabou por interpretar “The Greatest Love of All”, de Whitney Houston, e ficou em segundo lugar, num concurso conquistado por Jorge Macial.

O prémio foi motivador. E como efeito da visibilidade conquistada no “Fantasia”, Neyma [seu nome artístico] passou a ser figura de cartaz em alguns clubes nocturnos de Maputo, bares, escolas, e em vários eventos. Mas “nos tempos em que cantava nos bares, tive de fazer muitos shows, até ter a casa cheia”.

Nos clubes nocturnos, ela partilhou palco com músicos experientes, como Fernando Luís e Adérito Gomate. No entanto, para ganhar a vida dedicou-se à promoção de venda e ao esteticismo. Porém, apercebeu-se que a sua “praia” era mesmo a música.

Foi naquele contexto, que a jovem decidiu aprimorar o canto, tendo aulas com o professor Sumaine Saíde. Ele deu-lhe algumas lições de música na Casa Velha. Quando sentiu-se minimamente preparada, trabalhou com Júlio Silva, seu primeiro produtor, e lançou o primeiro álbum, “Brigas”, em 1999.

A obra é composta pelos singles: “Brigas”; “Mãe, Virtude mais Bela”; e o grande sucesso, “Praia Feliz”. O último número musical abriu espaço para mais exibições, e confiança dos editores. O impacto do trabalho apresentado levou a artista a lançar os álbuns “Baila” (2000), e “Renascer” (2001).

Refira-se, ainda, que Neyma faz parte de uma geração de artistas inicialmente contestada por aparentemente ter desvirtuado a música moçambicana. Na base das acusações, estava a introdução de elementos de rap, passada, zouk, kizomba, pandzula, e outros ritmos  estrangeiros nas suas produções.

Com o tempo, os artistas da sua geração procuraram melhorar, impondo um estilo distintivo e cantando sobre situações locais. Desta forma, conquistaram a atenção do público.

As canções de Neyma destacavam-se por versarem sobre o amor e questões sociais, cantadas em Português e Rhonga, uma das 24 línguas bantu, faladas em Moçambique.

A música “Nunawamina” (meu marido) com a qual conquistou o prémio de Artista Feminino Mais Popular, em 2002, por exemplo, fala do amor. A artista conta a história de uma mulher apaixonada pelo marido. Há uma mistura das duas línguas. A faixa por meio da qual conquistou o prémio “Música Mais Popular”, no Ngoma Moçambique (concurso de música promovido pela Rádio Moçambique) – “Lirandzo” – narra a história de uma mulher que assegura ao seu marido que amor entre eles não acaba.

Para além das conquistas dos dois prémios, o primeiro grande show de Neyma realizou-se a 5 de Novembro, no África Bar, em Maputo. Aplaudida por pessoas que preenchiam a sala por completo, a cantora interpretou a música de Fany Mpfumo, num dueto com João Paulo.

Três anos depois, a artista deu um passo significativo na carreira, lançando o seu quarto álbum, “Arromba”. Aquela obra fez o talento de Neyma alcançar mercados musicais de Angola, Cabo Verde, e Portugal.

“Arromba” é, até à actualidade, o álbum mais vendido da cantora, ultrapassando 40 mil cópias, em Moçambique, facto que lhe valeu o Disco Platina, atribuído pela Vidisco, em 2006. A obra cantada no género Kizomba, acabou por ser o hino de verão no ano de lançamento (2005).

Em Dezembro de 2006, Neyma deu sinais de diversificação de género musical, através do lançamento do álbum “Idiomas” . Para além de misturar línguas, houve um mix de marrabenta, coupé-décalé, kizomba, e ritmos tradicionais de Moçambique.

As faixas do álbum carregam mensagens de cunho social, fazendo em algumas músicas, uma advertência em relação aos problemas conjugais. O lançamento dos álbuns “Arromba” e “Idiomas” aconteceu sob produção de Dinho XS, uma parceria que viria acabar em 2008.

No mesmo ano, Neyma viajou até Hong Kong, onde pretendia pesquisar a possibilidade de se fabricar uma boneca com as suas feições. Trata-se de uma sonho que a cantora tinha já plantado na sua mente, mas sobre isso continuaremos a escrever daqui a mais alguns parágrafos [risos…].

Para comemorar os 10 anos de carreira musical, Neyma publicou o seu sexto álbum, “Neyma 10 anos”. Destacam-se as faixas “A Hi Dzimeni” e “Obrigada Meu Povo”. Com a primeira música, ela incentiva os moçambicanos a envolverem-se no movimento agrícola no país e a cultivarem para um Moçambique melhor. A faixa pode, metaforicamente, ser entendida como um incentivo ao trabalho, em todas vertentes.

Por seu turno, com a música “Obrigado Meu Povo”, Neyma agradece os moçambicanos, em particular os seus fãs, pelo carinho que lhe têm dado. Para tal, recorreu mais uma vez, às línguas bantu. Os agradecimentos são proferidos nas línguas mais faladas em cada província do país. Aquele álbum marcou, também, o início da aposta de Neyma na Marrabenta, uma manifestação cultural predominante no sul de Moçambique.

A celebração foi feita através de um espectáculo musical. A chuva que caíra na noite de sexta-feira, justamente à hora marcada para o arranque do espectáculo, isto é, às 22:30 horas, quase que comprometia o lançamento do sexto disco de Neyma, mas os fiéis admiradores da cantora mantiveram-se no local e deliciaram-se com a música da banda que a acompanhou.

Ao longo das duas horas que durou o evento, Neyma esmerou-se ao máximo, provando ser uma exímia cantora e dançarina, muito bem acompanhada pelas bailarinas que apresentaram uma coreografia tipicamente moçambicana, onde a marrabenta foi o ritmo que mais sobressaiu.

Aquela obra serviu para dar início a procura de outros mercados, de forma a internacionalizar a sua carreira, um objectivo reforçado com lançamento do single “Ilusão”, que contou com a colaboração do músico cabo-verdiano Grace Évora. Com aquela obra, Neyma conquistou o prémio de “Melhor Canção” do ano (2010), no Mozambique Music Awards.

Em 2011, Neyma combinou a sua aposta na Marrabenta à sua forma de vestir, adoptando a capulana como seu estilo. “Achei que para este género musical nada melhor que ser original”. Os vestidos de gala, macacões, saias e calções, passaram a ser idealizados por ela e, em seguida, os alfaiates passaram a conceber para a cantora. Em paralelo com a sua carreira musical, Neyma era a cara para as campanhas publicitárias do Ministério da Saúde.

No ano seguinte, a cantora lançou o seu maior hit, “Como Anima a Marrabenta”, com o qual bateu um recorde, arrebatando quatro prémios, em igual número de categorias, no Mozambique Music Awards (2013). Apesar de a música exaltar o estilo musical Marrabenta – como passou a identificar-se a cantora depois do álbum dos 10 anos – e a coreografia realizar passos do género, a obra não é Marrabenta, é Fena. De acordo com célebre músico, João Domingos, trata-se de um ritual em que os homens dançam imitando os movimentos de um macaco.

Agora sim, podemos falar sobre o sonho que fez Neyma ir à Hong Kong. Em Janeiro de 2013, a cantora lançou produtos licenciados da sua marca “Neyma”, nomeadamente: botas; sandálias; cadernos; canetas; acompanhados de um single dedicado ao mundo infantil. Iniciou daquela forma o projecto musical dirigido às crianças, num país em que há poucos artistas que de se dedicam à produção de música infantil; e os cantores de “palmo meio” que fazem músicas para crianças estão relativamente distantes dos media. O single infantil de Neyma, “Parabéns”, foi escrito pela cantora e sua filha Yumna. A produção esteve na responsabilidade do músico e produtor G2.

Dois mil e catorze iniciou com tristeza. A 29 de Março, o pai da cantora morreu.

“Assim passámos o dia do pai, felizes e nem fazias ideia da data 19 de Março, Dia do Pai. Esqueceste-te completamente, pois foram dias, semanas, um mês deitado nessa cama e sempre a perguntar que dia de semana é? Que horas são? O médico chegou? Enfim. E ontem, quando me despediste percebi no teu ‘Tchau’ algo estranho! Afinal porque hoje, dia 29 de Março, voltaria à clínica para te dar um outro adeus, com lágrimas nos olhos! Até Sempre meu pai. Vou sempre me lembrar de ti assim com este sorriso. Não existe partida para aqueles que permanecerão eternamente em nossos corações!”, desabafou a artista na sua página oficial, nas redes sociais.

Em Novembro, Neyma foi nomeada embaixadora nacional para o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em Moçambique. Ainda naquele ano, a artista foi convidada a participar na Coca-Cola Estúdio África, onde colaborou com o nigeriano Phyno, e mais tarde com Wyclef Jean, com quem trabalhou em uma versão especial de sua canção “Divino Sorrow” para a luta RED Campaign’s contra o SIDA, numa edição especial.

No mês seguinte, o Cinema Gil Vicente, na cidade de Maputo, ficou pequeno para acolher os inúmeros fãs que quiseram ver a artista em palco, celebrando os 15 anos de carreira. Num show que durou mais de três horas, Neyma aproveitou o ensejo para agradecer o público, que lhe tem acompanhado, e a “matar” a sede dos fãs que há muito tempo não assistiam aos seus concertos. No espectáculo televisionado, Neyma actuou com cantores moçambicanos de diferentes gerações entre os quais: Mingas; Stewart Sukuma; Valdemiro José; Júlia Duarte; Dama do Bling; Cláudio Ismael, Lil Banks e Mr. Bow.

Ela também aproveitou a oportunidade para lançar edição limitada da sua compilação especial, CD duplo, “Neyma Greatest Hits”, que já está a caminho de ser um “best-seller”.

No ano seguinte, Neyma foi indicada para fazer parte da categoria melhor artista feminino dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), na primeira edição do African Entertainment Awards, que aconteceu a 31 de Outubro, nos Estados Unidos.

A moçambicana disputou o prémio com Suzanna Lubrano, Pérola, Karyna Gomes e Bruna Lee. Conquistava o prémio a mais votada e o escrutínio era feito num site na internet. Neyma foi a mais votada e arrebatou o prémio de Melhor Artista Feminino dos PALOP.

A mulher que veio ao mundo a 6 de Maio de 1979, hoje mãe de um casal e solteira à luz da lei (mas comprometida), é actualmente uma das vozes mais acarinhadas pelo público moçambicano. E é uma das cantoras com mais contratos publicitários no país.

Apontamentos de rodapé

Se não fosse cantora seria actriz, decoradora ou cozinheira. Neyma adora representar e consegue muito rapidamente captar o texto e encarnar a personagem que lhe é atribuída. Ela foi actriz no seriado “Sorriso”. Defende a necessidade de os músicos moçambicanos se unirem para que a música do país possa crescer. Andebol é a sua modalidade favorita. Gosta de frequentar o ginásio. Caril e arroz é o seu prato favorito. Cozinhar e ouvir música são os seus hobbies favoritos. Gosta, também, de ver bonecos animados. Acredita que ainda não está pronta para casar, pois não pretende se separar quando isso for a acontecer. Selecciona as amizades, boa parte delas são pessoas com quem trabalha. É católica, mas não vai à igreja aos domingos, por isso se acha pagã. Ainda assim, reza consigo mesma. Não se sente famosa, acha-se uma figura pública apenas. Considera-se, também, uma mulher cheia de força e coragem.

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