Revista Biografia

Ancha Salvador

Alguém disse um dia: quem vive um problema e o supera está em melhores condições de ajudar aos outros. A empreendedora Ancha Salvador é daquelas moçambicanas na qual é confirmado este ditado e tem procurado tirar bom proveito disso.

Ela padeceu por muitos anos de uma doença que os médicos não conseguiam diagnosticar. Em 2011, um médico conseguiu dizer-lhe o que a atormentava. Os resultados das análises indicavam que ela tinha alergia ao glúten.

Assim se manifestava a enfermidade na Ancha: erupções na pele; asma; gastrite; fraca capacidade anímica; ganho de peso, chegou a pesar 96 kg. Tudo à conta daquela alergia. Não podia comer pão, bolos, farinha, massas, ou seja, não podia ingerir nada com glúten.

O resultado anunciado pelo médico implicou uma reforma no seu quadro alimentar. Ela teve que abdicar de comer pão, mandioca, batata-doce e outros alimentos. No princípio foi difícil abrir mão, pois já estava acostumada. A teimosia pesou nos primeiros meses, porque se perguntava o que iria comer? Contudo, foi uma questão de tempo para ela própria ver que estava a prejudicar-se.

Foi daí que tomou a decisão de pesquisar o quadro alimentar de uma pessoa com alergia ao glúten. Soube, assim, que podia fazer pão a partir do arroz. Então passou a pilar o arroz, agregando ovo e fermento, fazendo o pão para tomar chá. Mas, no princípio, saía um pão mais “pedra” que outra coisa. Do mesmo modo começou a fazer biscoitos também.

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Ela teve dificuldades de comer aquele pão. Era duríssimo, podia servir de arma de defesa pessoal… Mas foi-se acostumando. A sua família incentivava-a a continuar na produção daqueles pães sem glúten para ter o que comer. Depois de ultrapassar a fase em que não podia comer batata-doce e mandioca, passou a incluir tais alimentos como ingredientes para fazer o seu pão. 

Depois de um tempo, apareceram amigos em sua casa que pediram para provar. Mas ela pensava muitas vezes que eram coisas que não prestavam, embora a família, suas cobaias preferidas a animassem a continuar.

No meio desse processo, Ancha conheceu uma família brasileira que tinha o mesmo problema e que já fazia aquele tipo de alimentos para vender. Então, Ancha foi fazer um curso de duas semanas com eles, no Brasil. Naquele curso, ela aprendeu as técnicas de produção dos alimentos sem glúten.

Foi a partir daí que Ancha passou a incluir o fermento próprio para os alimentos que produzia. Depois desse curso, começou a produzir e vender para as outras pessoas que estavam na mesma situação que ela. Todavia, o fermento tinha de ser importado a partir de Portugal e era difícil. Houve dias em que teve défice, os clientes pediam e ela não tinha nada feito por falta de fermento. Por isso, desenvolveu um fermento caseiro.

Entretanto, a produção do fermento caseiro também lhe foi difícil, até que surgiu uma senhora que passou a trazer o fermento dos EUA. Com o andar do tempo, Ancha investigou mais e foi aperfeiçoando, chegando a ter clientes que, apesar de não terem alergia ao glúten, compravam os seus produtos para provar novas coisas.

Posteriormente, começou a apostar na diversificação. Actualmente, tem uma lista com 24 produtos alimentares sem glúten. Entre os alimentos que produz incluem-se bolos, pães, doces e outros.

Começou a participar em alguns eventos, onde falava do seu trabalho e onde a questionavam se estava legal. Foi então que viu a necessidade de criar a sua empresa, à qual atribuiu o nome Anchaa’s Gluten Free. E passou a ter duas principais fontes de clientes: pessoas alérgicas e as que procuram emagrecer, entre nacionais e estrangeiros.

Ancha começou a trabalhar na cozinha da sua casa. Mas, por volta de 2017, decidiu alugar uma instalação para evitar a contaminação dos seus produtos, uma vez que a sua família consome pão normal também. Ela começa a trabalhar às 6:30 horas e por volta das 16:00 horas volta para casa. A sua empresa tem duas outras trabalhadoras e produz por encomenda. Há produtos que faz e guarda no congelador para ter capacidade de responder às pessoas que querem os produtos na hora.

Infância e percurso académico

Ancha Aly Amade Salvador nasceu a 1 de Junho de 1973, na cidade de Chimoio, em Manica. Ela é filha de Aly Amade e Anchura Sualé Bin Aly. Nasceu em Chimoio porque o seu pai trabalhava no Instituto Nacional de Meteorologia e estava em missão de serviço.

Ela tem muitos irmãos. Mas, cresceu com os tios e a prima em Mafalala, na cidade de Maputo. Aos cinco anos de idade, a sua mãe, que padecia de cancro, pediu à sua irmã para cuidar da Ancha. Foi nesse contexto, que a pequena Ancha cresceu em casa da sua tia.

No bairro da Mafalala vivia num quintal com duas casas. Uma das residências era da avó materna e a outra da tia, onde ela morava. Ela vivia com os tios e a prima. As memórias da época que a alegram são os jogos de neca e o salto à corda com as outras crianças do bairro.

Começou a frequentar a escola aos seis anos na Escola Primária Unidade 13, onde estudou até à 4.ª classe. Seguiu para a Noroeste 2, onde fez a 5.ª e a 6.ª classe. Depois foi para a Secundária Josina Machel, onde concluiu o nível básico (10.ª classe). Em todo esse percurso a pessoa que a marcou foi a professora Olga, que lhe deu aulas na 2.ª classe.

A professora Olga marcou-a pela forma simpática como tratava as crianças e pelas mensagens de encorajamento que dava durante as suas aulas.

Aos 23 anos de idade, decidiu voltar a estudar. Para o nível médio, a Ancha optou por seguir o ensino técnico. Fez o nível médio em Relações Públicas e Marketing no IEG. E aos 27 anos de idade, decidiu parar de trabalhar e dedicou-se a tempo inteiro aos estudos e à família. Para tal, fez o pré-universitário no ISPU (hoje A Politécnica).

Na Universidade A Politécnica fez ainda o Bacharelato e a Licenciatura em Marketing e Publicidade. Fez também uma pós graduação em Gestão Estratégica de Marketing e está a preparar-se para defender o Mestrado na mesma área.

Lar

Depois de ter o seu primeiro filho, Ancha passou a viver sozinha com o seu filho. E, para garantir o seu sustento, começou a trabalhar. O seu primeiro emprego foi na Interfranca.

Entretanto, apareceu uma oportunidade para o Fundo Bibliotecário de Língua Portuguesa que aproveitou. E foi aí que conheceu o seu futuro marido, Joaquim Salvador, com quem casou e vive há mais de 23 anos. Formou-se assim uma família com três filhos.

Nasceu também naquela família a ANARKALY, uma escola de língua portuguesa para estrangeiros. A escola surgiu em 2004. Ancha chegou a trabalhar por um tempo lá, como administradora geral, ajudando o seu marido. Actualmente, o marido cuida da ANARKALY e a esposa da Anchaa’s Gluten Free.

Ancha Amade Salvador é muçulmana praticante, ou seja, procura basear a vida segundo os ensinos da sua religião. O esposo não é religioso, mas a convivência é saudável. O marido aceita e respeita a opção da sua esposa. Dentre os filhos, um segue a mãe e dois seguem o pai.

Passatempos

A empreendedora é apaixonada pelo artesanato, caminhar, ouvir música, dançar, viajar e conhecer novos lugares. Já foi a vários países, como o Botsuana, Suazilândia, Portugal, Brasil e, com mais frequência, à vizinha África do Sul.

About Author /

É jornalista e webdesigner desde Setembro de 2013. Na sua caminhada jornalística, está registada sua passagem pelo jornal O Nacional; Revista ÍDOLO, onde chegou a desempenhar as funções de editor executivo; para além de ter sido oficial de marketing digital na Ariella Boats. Foi, também, jornalista correspondente da Revista MACAU, em Moçambique. Actualmente é jornalista do jornal Notícias. É, desde 2020, licenciado em jornalismo, pela Universidade Eduardo Mondlane (UEM). Sua caminhada no mundo do empreendedorismo digital iniciou com o lançamento da plataforma Biografia, em 2016. É também, o fundador do site evangelístico Chave de Davi, em 2018; e da loja online O Ardina Digital. Todos projectos foram concebidos ao lado do seu amigo Deanof Potompuanha.

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